Um dia com o Nissan Leaf
Modelo elétrico está no Brasil em demonstração e é hoje a aposta mais realista para um automóvel ecologicamente correto
A Nissan não teve vergonha de dizer que a inspiração para o Leaf veio da Apple. A empresa de tecnologia criada por Steve Jobs - e que tem hoje os gadgets mais desejados do mundo - promoveu uma mudança entre os computadores pessoais tão grande a ponto de a montadora japonesa desejar o mesmo para o segmento automobilístco.
Não é à toa que o Leaf, seu primeiro carro ecológico de série, apostar de cara na tecnologia 100% elétrica, dispensando motores a combustão para auxiliar o trabalho de recarregar baterias, o ponto-chave nesse tipo de veículo.
E o Leaf está para os automóveis assim como o iPad foi para os computadores pessoais. Significa um rompimento com a maneira de se dirigir e manter um veículo. O AUTOO teve contato com o Leaf, que chegou ao Brasil para participar da C40, um encontro entre os prefeitos das maiores cidades do mundo. Agora que o evento acabou a Nissan mostrará o modelo elétrico pelo Brasil na tentativa de acelerar a aprovação de um projeto que permita a comercialização desse tipo de veículo.
Confira a seguir como seria um hipotético dia com o Leaf e entenda que mudanças ele e os futuros elétricos causarão na nossa vida.
20h00 – Chego em casa, estaciono o Leaf na garagem do prédio e o conecto no terminal de recarga de 220V. Ele está com uma autonomia restante de 40 km, ou seja, 25% do total. Com isso, serão necessárias seis horas para completar a carga e não oito caso o modelo estivesse totalmente descarregado: “raramente você chega no final de dia sem nada, assim como no celular”, explica André Maranhão, consultor da Nissan. “Então, o tempo máximo de carregamento só acontece em situações extremas”.
Vocês devem estar se perguntando em que tomada o Leaf foi ligado. Mesmo que exista alguma na garagem da sua casa e que seja 220V será preciso um terminal da Nissan, que custa US$ 2.000, e tem o devido aterramento além do plug padrão do modelo. Segundo a montadora, a tendência é que as novas construções já prevejam essa necessidade. A Nissan diz que algumas construtoras já consultaram a empresa para entender como antecipar essa demanda.
6h30 do dia seguinte – Levanto da cama e descubro que o dia está muito quente. Para não chegar ao Leaf e ter que utilizar o ar-condicionado ao máximo ativo o sistema pelo iPhone e escolho a temperatura adequada. Como está conectado ao terminal de recarga, o Nissan aproveitará para não utilizar energia das baterias nessa função.
7h30 – Chego à garagem e as portas do Leaf destravam pela presença da chave i-Key. Já dentro do carro aclimatado, ajusto o cinto e aperto o botão de partida. O único sinal de mudança vem do painel sendo ligado e do símbolo no console que avisa que o Leaf está pronto para uso. Esqueça vibração, injeção de gasolina para partida a frio ou mesmo a vibração característica de carros a combustão – sem falar na fumaça saindo do escapamento.
7h45 – Já fora do condomínio enquanto lembro do meu carro antigo, que engasgava até esquentar, uso o Leaf sem nenhuma restrição de desempenho. Meu caminho até o trabalho possui cerca de 20 km de distância. Escolho o modo Eco já que o trânsito está pesado – no modo D teria mais torque, porém, como estou preso no tráfego, é desperdício utilizar tanta energia à toa. Já no modo Eco, o consumo cai e o Leaf gasta apenas o necessário para se mover.
8h00 – Enquanto do lado de fora há o barulho de caminhões, ônibus e buzinas, sigo o caminho curtindo um som cristalino vindo do sistema de áudio. A música chega aos ouvidos limpa não pela qualidade e sim porque o Leaf precisa ter uma acústica acima da média. Sem o ruído do motor, barulhos que passavam despercebidos agora são notados.
8h30 – Livre dos principais pontos de congestionamento, decido voltar ao D e ganhar agilidade no trânsito já que deixarei uma via principal para utilizar ruas locais e com ladeiras. O Nissan mostra fôlego de sobra com sua aceleração contínua e torque alto – como não há transmissão, não precisamos reduzir marchas nem se preocupar em perder o embalo.
8h45 – Chego ao trabalho, estaciono o Leaf no prédio da empresa que não possui sistema de recarga. Porém, a autonomia restante é boa: 110 km. Com o trânsito, a média de consumo de energia é maior, apesar do uso do modo Eco.
13h30 – Ao voltar do almoço recebo uma ligação de meus pais. Eles estão no aeroporto e chegaram antes do previsto. Sem conhecer direito a cidade, prefiro que eles não peguem um táxi.
13h50 – Resolvo buscá-los, mas, ao acessar o GPS de série do Nissan, vejo no mapa que o alcance atual não é suficiente para ir e voltar.A solução é parar num posto de recarga rápida. Chego ao local com 100 km de autonomia restante. Com esses sistema, 80% da carga é recuperada em 30 minutos, mas só preciso de 14 minutos parado para completar os 84 módulos de bateria que ficam no piso do carro.
14h40 – No caminho para o aeroporto aproveito para recuperar parte da energia nas frenagens já que o Leaf vem com o sistema KERS, aquele usado na Fórmula 1. Basta, para isso, frear de maneira progressiva, antecipando um semáforo fechado ou uma descida mais íngreme.
15h10 – Encontro meus pais no desembarque do aeroporto. Eles estão cheios de malas, mas a capacidade do Leaf é suficiente – com 401 litros, ele se equipara a alguns sedãs, por exemplo, geralmente mais generosos nesse quesito. Como as baterias são planas e do tamanho de um laptop, foi possível manter os espaços quase intactos. Pena que o Leaf não traga estepe. Em vez disso, usa o sistema run-flat, que mantém o pneu num mínimo de condição de uso para chegar a um borracheiro.
Minha mãe senta no banco traseiro e mal percebe diferença de espaço. Como mede apenas 1,60 m, suas pernas não sentem o piso elevado no estilo picape média. Pois é, o Leaf revela aonde as baterias estão nessa hora.
15h30 – Na estrada meu pai se espanta com silêncio a bordo. Sem o rádio ligado, quase não se ouve o barulho do vento isso porque um dos elementos mais barulhentos, o retrovisor externo, teve o fluxo de ar desviado pelo formato proeminente dos faróis.
16h00 – Deixo meus pais em casa e volto ao trabalho. Estaciono o Leaf com 75 km de autonomia.
20h00 – Saio do trabalho à noite e a iluminação de leds dos faróis (mais econômicos) facilita a visão com toda chuva que encontro. Sim, uma daquelas tempestades de verão cai na cidade, alagando ruas pelo trajeto de volta para casa. Lembro de estar num carro carregado de energia elétrica, mas a marca garante que o Leaf é preparado para enfrentar chuva, gelo e neve sem riscos de curto-circuito.
20h50 – Estaciono o Leaf com 40 km de autonomia restante e volto a ligá-lo no terminal de recarga para prepará-lo para mais um dia de trabalho sem poluir o ambiente com monóxido de carbono e ruído.
Igual a um esportivo
Especialistas e executivos de montadoras instaladas no Brasil são quase unânimes em apontar o carro elétrico como o futuro do setor. Por aqui, o etanol atrasará a chegada dos elétricos porque é uma das poucas políticas de energia renovável em vigor no mundo, mas é fato: cedo ou tarde, os veículos elétricos farão parte do nosso cotidiano.
Por essa razão, montadoras como a Nissan, Renault, Mitsubishi e General Motors já se mexem para pressionar o governo brasileiro a conceder benefícios para os modelos elétricos e híbridos. Mas hoje a situação é completamente inversa: os elétricos pagam 25% de IPI porque nossa legislação não prevê carros sem motores a pistão. Na dúvida, o governo enquadra o elétrico da mesma forma que um superesportivo com motor V12.