Ricardo Meier

Comenta o mercado de vendas de automóveis e tendências sustentáveis

Juntas, FCA e PSA terão de provar que tamanho é documento

Embora a soma de seus números a fará ultrapassar muitas rivais, fusão entre os dois grupos automobilísticos também ampliará o potencial de problemas, entre eles o excesso de capacidade produtiva

Não há dúvida que a fusão entre a FCA e a PSA, anunciada nas últimas semanas, criará um colosso na indústria automobilística, com 14 marcas e a produção de 8,7 milhões de veículos por ano, volume capaz de galgá-la para o 4º lugar no ranking mundial.

Mas, assim como o lado positivo, os problemas também ganharão escala ainda mais quando o mantra repetido em negócios como esses (e usado pelas duas empresas) promete manter marcas, fábricas em empregos intactos.

Trata-se, no entanto, de algo literalmente impossível. Se o objetivo da fusão é reduzir custos, não há sentido unir duas culturas (formadas por diversas subculturas) sem que parte do excesso de gordura seja extirpado. A única exceção nesse cenário é que o novo grupo ampliasse suas vendas de forma significativa para ampliar sua produtividade e assim compensar suas deficiências atuais.

Mas essa hipótese é ínfima afinal nem FCA muito menos PSA passam por um momento tão glorificante assim no mercado mundial. Seu principal foco, os compactos europeus, estão sob ameaça de uma legislação ambiental mais rigorosa e que exigirá investimentos em plataformas para cumprirem metas de emissão. Ou seja, parece difícil pensar em conciliar boas vendas de marcas como Peugeot, Citroën, Fiat e Opel na Europa. Alguém pode sobrar pelo caminho.

Fora da Europa, Fiat e PSA sofrem com vendas irregulares e praticamente inexistentes nos EUA e China, os maiores mercados automobilísticos do mundo. O ponto fora da curva é a Jeep, única marca global da associação, que tem crescido, mas que ainda não conquistou os europeus, e em menor escala a RAM, sobretudo nos EUA.

E quanto à América do Sul, especialmente Brasil e Argentina? O quadro é preocupante. Embora a FCA, na soma de Fiat e Jeep, detenha o maior volume de emplacamentos em nosso mercado e o 4º no vizinho, não é uma posição confortável. Já a PSA vive um momento mais crítico mesmo na Argentina, onde tem mais tradição. No Brasil, a situação é a pior em muitos anos com previsão de terminar 2019 com menos de 50 mil veículos vendidos na soma de Peugeot e Citroën.

Fábrica da Peugeot-Citroën em Porto Real (RJ): produção bem inferior à capacidade
Fábrica da Peugeot-Citroën em Porto Real (RJ): produção bem inferior à capacidade
Imagem: Divulgação

Fábricas vazias

É na capacidade ociosa, no entanto, que o futuro grupo oriundo da junção de FCA e PSA tem seu "calcanhar de Aquiles". As cinco fábricas instaladas no Brasil e Argentina podem produzir quase 1,5 milhão de veículos por ano, mas devem terminar este ano com menos de 650 mil unidades emplacadas nos dois países. Na FCA, a ociosidade gira em torno de 50% e na PSA assustadores dois terços da capacidade das plantas de Porto Real e El Palomar somadas. Em outras palavras, para viabilizá-las seria preciso ampliar as vendas como nunca, mas faltam produtos para isso.

A única fábrica bastante ocupada é hoje Goiana, em Pernambuco, onde são produzidos os Jeep Renegade, Compass e a picape Toro, da Fiat. Mesmo diante da perspectiva negativa na região, a PSA decidiu reinvestir em suas duas fábricas para produzir modelos da plataforma CMP, o primeiro deles, o novo 208, previsto para chegar ao mercado no início de 2020, desta vez montado na Argentina.

Certamente, a Fiat deverá se beneficiar da plataforma CMP para lançar novos modelos compactos e a PSA, ganhar musculatura com o expertise da FCA com sua rede de concessionárias, mas qualquer passo rumo à eficiência fará com que o excesso de capacidade e vários setores estratégicos de desenvolvimentos sobrem pelo caminho. Afinal não há necessidade de tanta gente se haverá mais compartilhamento de tecnologias, boa parte delas importada da Europa.

E, acima de tudo, como já dito nessa coluna, restará ainda o mais difícil, convencer o consumidor a deixar de lado marcas com imagem mais consagrada, como Toyota, Hyundai e Honda, para dar mais um voto de confiança a elas. E para isso, certamente não significa que tamanho é documento.

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