HB20 mais vendido é mais uma das meias verdades da indústria automobilística
Na tentativa de passar uma imagem positiva de seu modelo, Hyundai misturou e omitiu números para ficar bem na foto
Já ficou célebre no meio jornalístico automotivo um executivo de uma marca que mostrava grandes números de seu produto alegando que ele seria líder em vendas em determinada região e público-alvo. Ou seja, o tal carro estava a anos-luz de qualquer número expressivo, mas ao buscar uma amostragem muito específica, a montadora dava um jeito de passar uma imagem mais positiva a seus potenciais clientes.
A prática é comum na estratégia de marketing de praticamente todos os setores da indústria, mas as montadoras são mestres em espalhar meias verdades. A mais recente ocorreu na semana passada quando a Hyundai quis provar por “A+B” que o HB20 vendeu mais que o Onix pela primeira vez.
À luz dos números, seu argumento é comprovado. Segundo a marca, a nova geração do hatch teve 2.729 emplacamentos em abril enquanto seu rival, o Onix, acumulou 2.646 vendas no modelo renovado. Veja que aí já temos a primeira manipulação de dados: ao ignorar os dados das primeiras gerações, a Hyundai tirou a vantagem da Chevrolet, que na soma geral obteve 3.619 unidades contra 2.837 do HB20. Mas não foi só.
Para a Hyundai, o Onix só é líder “devido à sua maior capacidade de produção”, diz a nota da marca. Novamente, a montadora recorreu à meia verdade já que sua fábrica em Piracicaba está realmente no limite enquanto a GM desfruta de um parque fabril mais capaz, mas é difícil crer que se a situação fosse inversa veríamos o HB20 na frente. E não por demérito do modelo e sim porque entram nesse cálculo outros fatores não citados convenientemente pelos coreanos como rede de concessionárias, estratégias de preços e o próprio perfil do público.
Mas é ao fingir que essa suposta liderança ocorreu de forma natural que a Hyundai abusou da inteligência do público. Explica-se: dos 2.837 HB20 vendidos em abril, 1.639 foram emplacados em Minas Gerais ou 58% do total.
Como se sabe, o estado é território de locadoras de automóveis e que fazem pedidos no atacado e a preços promocionais às montadoras. Nesse sentido, o HB20 realmente sobrou nas chamadas vendas diretas, com 1.544 emplacamentos comparados aos 1.174 Onix vendidos sob o mesmo tipo de negociação. Trata-se inclusive de algo pouco usual na Hyundai, que costuma privilegiar o consumidor final.
Gol depois do apito do juiz
E o que se deduz disso? Que a “liderança” do HB20 foi simplesmente uma coincidência, numa hipótese ingênua. Em um mês atípico como abril, com queda de 76% nos emplacamentos por conta da pandemia do coronavírus, qualquer pedido mais volumoso é capaz de criar ilusões nas estatísticas, algo que seria improvável em um mês normal.
Resta entender por que a Hyundai se sujeitou a isso. Talvez uma das razões envolva algo novo para a montadora sul-coreana, uma inesperada reprovação à segunda geração do HB20. O modelo, que estreou em 2012, transformou a então importadora em uma das maiores montadoras no Brasil. Em poucos meses, a capacidade da fábrica de Piracicaba chegou ao limite e tem se mantido assim desde então.
Os coreanos, no entanto, dão pinta de que foram picados pelo mesmo “mosquito” que fez a Peugeot achar que chamar o 206 com carinha nova de 207 passaria despercebido do consumidor. Como se viu, até hoje os franceses não se recuperaram do baque e mesmo com bons carros nunca mais venderam como no início dos anos 2000.
O novo HB20 é uma evolução coerente do primeiro modelo, mas talvez seus clientes esperassem mais. O salto dado pelo rival Onix foi muito mais nítido enquanto o Hyundai ainda deu azar de estrear um estilo polêmico e que virou piada recorrente em redes sociais.
Reverter essa situação é algo esperado da Hyundai, mas tentar aparecer bem na foto dessa forma é como comemorar gol depois que o juiz apitou o fim do jogo.
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